domingo, 9 de agosto de 2009

5. A particularidade da psicologia e psicotera-pia fenomenológico existencial

Acredito que para entendermos e adequada-mente avaliarmos o caráter e a contribuição fenomenológico existencial do paradigma de Carl Rogers, precisamos de um esboço, mesmo que tenta-tivo, naturalmente, de características definidoras de uma abordagem fenomenológico existencial de psi-cologia e psicoterapia.
É interessante observar que, nem Husserl, nem Heidegger, nem a fenomenologia da Psicologia da Gestalt (ainda que esta tenha uma contribuição importante, através das idéias de Max Wertheimer, e de Kurt Goldstein), é em Franz Brentano que va-mos encontrar as raízes seminais da psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial, tais como elas aparecem em Rogers (e em Perls). O Brentano em cujas concepções e métodos, inclusive, vamos encontrar raízes seminais das concepções das feno-menologias de Husserl, de Heidegger, da fenomenologia da Psicologia da Gestalt, das idéias de Max Wertheimer, e de Kurt Goldstein.
Em particular, e muito especialmente, no seu empirismo especificamente fenomenológico, e no seu mé-todo aporético, na sua apor-ética, (derivados estes de Aristóteles).
Naturalmente, não podemos esquecer, i-gualmente, as importantes raízes da PPFE (psicologia e psicoterapias fenomenológico existencial) na tradição hermenêutica compreensiva da filosofia da vida de Dil-they. E, daí, o seu prolongamento na hermenêutica existencial de Heidegger; que, ainda que não tenha sido uma influência direta sobre Rogers ou Perls (indireta, sim, via Medard Boss e Ludwig Binswan-ger), ajuda substancialmente a esclarecer o caráter interpretativo -- hermenêutico, no sentido compreensivo, fenomenológico existencial, e poiético -- da concep-ção e método da psicologia e psicoterapia fenomenológico existencial.
Não podemos esquecer, naturalmente, a in-fluência de F. Nietzsche como uma raiz seminal. A influência monumental de sua obra sobre o pensa-mento ocidental, e, em particular, sobre a intelectualidade e o meio artístico e intelectual ale-mão e europeu, desde os anos do Século XX anteriores à segunda guerra mundial, e que é o cal-do de cultura no qual vicejam o a fenomenologia, o existencialismo, e a psicologia e psicoterapia feno-menológico existencial. Em especial, a sua influência na constituição do movimento artístico e cultural do Expressionismo, que tanto determinou e influenciou o desenvolvimento da concepção e método da PPFE (psicologia e psicoterapia fenomenológico existenci-ais).
Nietzsche também chega, de um modo semi-nal, a estas abordagens, dentre outras influências, através das idéias psicoterapêuticas de Otto Rank, e das concepções filosóficas fenomenológico existen-ciais (...) de Martin Buber. Nietzsche exerceu marcante influência no desenvolvimento das idéias de ambos.
Nietzsche contribui, decisivamente, com o seu explícito e enfático apartamento do pessimismo que marca a filosofia de Schopenhauer (pessimismo que marcará seminalmente a concepção da Psicaná-lise). E, através de sua compreensão de que a alegria trágica é a força maior da existência.
Especialmente, Nietzsche contribuirá com a sua radical postura de afirmação da vida. Com a sua reafirmação do sentido do trágico (a vida merece ser ra-dicalmente afirmada, mesmo quando ela é finitude, e mesmo quando ela é sofrimento...), condição de poten-cialização do retorno da vida, condição da alegria, sentido do trágico recuperado aos gregos pré-socráticos.
Igualmente, Nietzsche contribuirá com o perspectivismo experimental de sua concepção do mundo, da verdade, da existência. Com a sua parti-cular concepção de experimentação (radicalmente diferente da concepção científica de experimentação), num sentido especificamente fenomenológico exis-tencial, e que caracteriza a sua Gaya Scienza, e que decisivamente marcará as concepções rogerianas (e de Perls).
As idéias, concepções e posturas de Buber, elas próprias, tiveram uma enorme influência no de-senvolvimento da concepção e método das PPFE. Tiveram uma grande influência sobre as concepções e método de Rogers, e de Perls. Em particular o es-clarecimento de Buber acerca da dimensão ontológica do eu-tu, e de sua relevância para a gera-ção e regeneração da existência humana; na reversão do decurso das coisas, do decurso do mundo e da vida coisificados, da fatalidade, e pro-cesso substrato da criatividade.
Podemos, assim, sumariar, tentativa e sucin-tamente (comentamos em seguida), alguns traços distintivos, e fundamentais, das psicologias e psico-terapias fenomenológico existenciais, extensi-vamente experimentados por Carl Rogers (e por Perls), na vivência e elaboração de suas concepções e métodos.


Comentamos a seguir alguns desses aspectos, em termos de:
1. Ontologia;
2. Epistemologia;
3. Concepção da existência;
4. Concepção da abordagem;
5. Metodologia


a. Ontologia
Não pretendo aqui discorrer filosoficamente sobre Ontologias, ou ser exaustivo acerca da questão ontológica das PPFE (ainda que esta seja muito im-portante). Mesmo porque isto estaria fora de minhas condições. O que quero, antes, é apontar distinções fundamentais, e direções.

O que sobressai, num primeiro momento, é, seguindo a Nietzsche e a Brentano, uma ruptura e diferenciação radicais com relação à perspectiva pla-tônica de cisão do mundo em um “mundo das essências” e um “mundo sensível”. O mundo das essências privativo dos desuses e das essências; o mundo sensível, simulacro do mundo das essências em todos os seus aspectos, repetição piorada, perti-nente à sensibilidade humana.
Para Nietzsche e para Brentano, a cisão não faz sentido. O mundo se dá exclusivamente na sen-sibilidade, como fenômeno, como vivência.
Esta perspectiva é uma base radical da Fe-nomenologia da tradição de Brentano, de Nietzsche, e das psicologias e psicoterapias fenomenológico e-xistenciais.
Dada esta perspectiva ontológica da realida-de, constituída sempre e exclusivamente como fenômeno -- perspectiva própria à Fenomenologia da tradição de Brentano, e à filosofia da vida de Ni-etzsche --, não podemos nos enganar com o existência dos termos “fenômeno”, e “fenomenolo-gia” na terminologia das filosofias de Kant, de Hegel e de Schopenhauer.
Parafraseando Deleuze, não existe compro-misso possível entre, de um lado, a Fenomenologia da tradição de Brentano e a filosofia da vida de Ni-etzsche, e, do outro, as filosofias de Kant, Hegel e Schopenhauer.
Pelo menos no que concerne à perspectiva ontológica básica do mundo como cindido em duas dimensões. Um “mundo fenomenal”, da ordem da consciência e do sensível, e um “mundo essencial”. Este designado por Kant como “numeno”, “mundo em si”, “coisa em si”; designado por Hegel de “espí-rito universal”; ou de “vontade” por Schopenhauer. Em contraposição sempre a uma dimensão fenome-nal, consciente, e inacessível ao mundo essencial.
A Fenomenologia, tal como a designamos modernamente, e tal como ela se constitui como raiz das abordagens fenomenológico existenciais de psi-cologia e psicoterapia, é a Fenomenologia da tradição de Brentano. Que rompendo com a pers-pectiva desta cisão do mundo em duas dimensões, dá origem às fenomenologias de Husserl, de Hei-degger, de Sartre, de M. Ponty, a fenomenologia da psicologia da Gestalt, e as psicologias e psicoterapi-as fenomenológico existenciais.
Esta precisão é muito importante. Na medida em que as filosofias de Schopenhauer, de Kant e de Hegel têm uma influência básica na constituição de um outro paradigma de psicologia e de psicoterapi-a, o paradigma psicanalítico, radicalmente diverso, neste sentido, do paradigma fenomenológico exis-tencial.


b. Epistemologia

Ao nível de sua vivência, o paradigma feno-menológico existencial não é um paradigma epistemológico, ou seja, um paradigma que privile-gie o conhecimento, no sentido da epistemologia formal.
Não que despreze o conhecimento epistemo-lógico, mas a sua vivência característica é mais de natureza de um desconhecimento, de uma embria-gues; do que da ordem do conhecimento formal, da ordem da lucidez. Como dizia uma colega de Tere-sina, mais da ordem de uma tomada de inconsciência, do que da ordem da tomada de cons-ciência.
No vivido fenomenológico existencial tole-ramos, e cúmplice e amigavelmente acolhemos, o confusional organísmico, no qual a consciência lúci-da se dissolve. Relativizamos o conhecimento e a consciência lúcidos. Em privilégio da originalidade da vivência fenomenal, pré-conceitual, dionisíaca, em suas intensidades corpoativas.
Naturalmente que a predominância de cada um dos modos de ser é tendencial. Hora predomi-nando a consciência lúcida, ora a consciência embriagada da vivência corpoativa. Em proporções diversas de mistura a cada momento.
O importante é que, tendencialmente, não predomina, na vivência, o conhecimento lúcido, o conhecimento abstrato, conceitual, teórico, teor-ético e teorizante. De modo que a vivência não se interes-sa pelo conhecimento, mas mais por este desconhecimento corpoativo, que, ainda que conhe-cimento, é índice de sua reversão em direção ao organísmico, ao desconhecer mental e mentalizante.
Uma outra questão é a de que o existencial, o fenomenológico existencial, não se dá na dimensão das relações sujeito-objeto. Perspectiva fundamental ao empreendimento epistemológico, como ato de conhecer de um sujeito.
Como se constitui, então, a epistemologia, a filosofia do conhecimento, deste modo de desconhe-cer, deste modo de ser que é um drible de corpo na consciência, e na vontade de saber, é uma questão. Que interessa sobretudo aos científicos.
É importante precatarmo-nos de que, na vi-vência fenomenal, não estamos na ordem da ciência, mas na ordem da hermenêutica. Base sobre a qual uma ciência pode se assentar, e que, como tal, su-bordina o empreendimento científico.
A vivência das abordagens fenomenológico existenciais de psicologia e de psicoterapia não é ci-entífica. As abordagens fenomenológico existenciais de psicologia e de psicoterapia não são científicas, não são da ordem da ciência.
E, se não o são, não é por serem menos – nem mais. Mas apenas em função do fato de que a exis-tência, o existencial e sua resolução, não são da ordem do científico e do epistemológico. A existência só se resolve existencialmente (M. Heidegger). E a psi-cologia e a psicoterapia laboram, em essência, ao nível do existencial. Que não é acessível ao científi-co, nem ao tecnológico.
Uma ciência humana de uma humanidade não científica? É um desafio para quem se interessa.
Uma arte da ato-ação no âmbito do inter hu-mano? É possível, e interessante. Por isso uma abordagem fenomenológico existencial vincula-se mais à perspectiva da arte do que à epistemologia da vontade de saber da ciência.
Apesar de não teórica a vivência, a teoria so-bre ela é sempre possível, e sempre decorrente. Em particular, como teoria hermenêutica, e não exata-mente como teoria científica, e epistemológica.


c. Expressionismo

O Expressionismo foi profundamente influen-ciado pela filosofia da vida de Nietzsche, e desenvolve-se no rico “caldo” de cultura que dá ori-gem à Fenomenologia e ao Existencialismo, e às PPFE.
O Humanismo, de filósofos do Século XIX, como Kierkegaard, Nietzsche, Brentano, que, para além de Hegel, buscavam resgatar a perspectiva da experiência humana como referência – resgatando as perspectivas de filosofias do Renascimento, e de filósofos gregos --, teve, igualmente uma influência fundamental.
Subjaz ao Expressionismo a consciência de que o humano não é da restrição à ordem do real. Como Heidegger viria a colocar, posteriormente, em sua fenomenologia existencial: a possibilidade é mais im-portante do que a realidade.
Os expressionistas, nas difíceis condições que determinaram a emergência de seu estilo, intuíam isto, de um modo forte. E entendiam que não é no modo da apolínea consciência lúcida, não é o modo da consciência teórica, da consciência reflexiva e conceitual, que nos permitimos a experiência feno-menal do vivido, a experiência da potência do possível, da possibilidade, e de seu desdobramento expressivo, ontologicamente definidor do humano.
O potente, possível e o seu desdobramento e atualização, ato-ação, ação, vivencia-se, apenas, ex-periencialmente, fenomenológico existencial-mente, vivencialmente.

E a primeira condição para permitirmo-nos a sua vivência, e a vivência fenomenal de seus desdo-bramentos, é o destronamento da hegemonia da realidade.
A realidade, como objetividade, o acontecido, a possibilidade realizada, e, por isso, despossibilita-da, despossuída, coisificada.
A potência do possível, da possibilidade, im-pregna a vivência fenomenológico existencial.
A potente possibilidade não é da ordem do real. Meramente porque o possível não é real, não tem o estatuto da realidade, realizada. Condição maravilhosamente colocada na frase de uma mu-lher, personagem de prosa de Fernando Pessoa, sobre o momento de um encontro com duas amigas: Estávamos cheias de sermos nós. E isso porque sabía-mos, com toda a carne de nossa carne, que não éramos uma realidade.
Isto os Expressionistas sabiam de um modo claro.
De modo que se propuseram em seu estilo a uma vigorosa relativização do princípio de realida-de, do positivismo, e da própria realidade.
Desenvolveram, assim, um estilo performático fenomenológico existencial, dramático, de produção ar-tística. No qual o artista concentrava-se na vivência fenomenal intuitiva de sua inspiração, buscando concentrá-la. Como uma mola contraída, prestes a soltar-se em distensão. Ou, como a musculatura contraída de uma pantera, prestes ao bote. Configu-rando-se performance expressiva -- na atividade da produção artística -- como ex-pressão corpoativa imediata desta concentração. Toda ela vivenciada fenomenológico existencialmente, ação, atualização de possibilidade. Insubmissa ao real e à realidade. Ao princípio de realidade, e ao positivismo do real.
A postura expressionista permitiu a expressi-vidade cultural e artística, em particular em, tempos de terríveis opressões, e exerceu uma poderosa in-fluência não só na arte, como na cultura de um modo geral.
Em especial, exerceu uma poderosa influên-cia nas concepções e metodologias das PPFE.
Fritz Perls sofreu uma influência direta, na medida em que vivenciou, desde a adolescência, os experimentos de teatro expressionista de Max Rei-nhardt, na Alemanha.
A influência das concepções. metodologia e estilo do Expressionismo espalhou-se por todo o meio artístico e cultural da Europa e dos EUA, nos vários campos das artes. Aparecendo integrado nas con-cepções e metodologias das PPFE a partir dos anos 50. Na medida que, em particular, a questão destas era a da expressividade, a da vivência do vivido fe-nomenal, como fonte ontológica do humano, como fonte ontológica de geração e de regeneração, de po-tencialização, de atualização de possibilidades, e de criatividade existencial.



d. Existencialismo

Tomamos o termo Existencialismo aqui no seu sentido mais genérico, que envolve a filosofia da e-xistenz, oriunda nas filosofias de S. Kierkegaard, e de F. Nietzsche, e que originam o existencialismo moderno, enquanto movimento filosófico, artístico e cultural; e a literatura existencialista, que aparece em particular em obras como a de Albert Camus, e de J-P Sartre.
É interessante observar que, mesmo ao nível do existencialismo, precisamos distinguir entre as várias raízes, e as particularidades que elas deter-minam.
Assim, é interessante observar que a perspec-tiva de raiz do existencialismo nas PPFE, tais como elas se apresentam, em seu caráter de hermenêuticas fenomenológico existenciais, nas abordagens de Ro-gers, e de Perls, provém de um modo importante da filosofia da vida de F. Nietzsche.
Ainda que tenham uma contribuição impor-tante das idéias e posturas de S. Kierkegaard, é a particularidade da filosofia da vida de F. Nietzsche que constitui aspectos definidores da especificidade de sua concepção e metodologia.
Interessante, ainda, é notar que, na juventude Nietzsche aproximou-se da filosofia de Schope-nhauer. Atraía-o sobretudo a possibilidade de que a filosofia de Schopenhauer resgatasse o sentido do trá-gico dos gregos pré-socráticos.
Nietzsche constatou que, de fato, a filosofia de Schopenhauer nada tinha de trágico, e apenas encharcava-se na perspectiva de uma soturna orgia de pessimismo.
Desde então, Nietzsche afasta-se da filosofia de Schopenhauer, no sentido de constituir a sua filo-sofia como um resgate da perspectiva trágica dos gregos pré-socráticos. Filosofia radicalmente afirma-tiva da vida, ainda que com o reconhecimento de que vida, finitude e sofrimento, necessariamente se imbricam. E de que a finitude e o sofrimento não são motivos para difamar e negar a vida.
A afirmação da vida, reconhecendo o caráter intrínseco da finitude e do sofrimento, é o que carac-teriza o sentido do trágico nietzscheano. A afirmação trágica da vida, mesmo quando da finitude e do so-frimento, é condição de criação, e de potencialização da vida. De potencialização das forças de seu retor-no – retorno que lhe é característico e intrínseco --, condição de promoção de uma super abundâncias de forças de vida, da criatividade e da alegria.
Em Nietzsche, portanto, o trágico é alegre; é condição da alegria, e da criatividade...
De modo que não há como confundir, o exis-tencialismo matizado pelo pessimismo schopenhaueriano, com o existencialismo alegre, trágico e potente radicado na filosofia de Nietzsche. Se não podemos dizer que a filosofia de Nietzsche é uma filosofia otimista – pessimismo e otimismo, uma questão de néscios, dizia ele –, podemos dizer que a postura de afirmação da vida a ela característica, a-firmação da vida mesmo quando do mais negro sofrimento, é condição da alegria. De promoção de uma superabundância de forças de vida, da potên-cia do retorno da vida, da criatividade, e da alegria.
De modo que não podemos pressupor uma perspectiva pessimista, de viés schopenhaeriano, no existencialismo -- na verdade de raiz nietzscheana -- que dá origem às PPFE. Nem Nietzsche, nem o exis-tencialismo de raiz nietzscheana, nem as psicologias e psicoterapias fenomenológico existenciais devem a Shopenhauer neste sentido. Como a Psicanálise, por exemplo.

Humanistas, Kierkegaard e Nietzsche compar-tilham a aversão ao universalismo e ao idealismo da filosofia de Hegel. E, em particular, compartilham a aversão à desqualificação da subjetividade e do in-divíduo, que é própria ao hegelianismo. Nietzsche acrescentará a sua aversão à valorização das paixões tristes. Rejeitam, assim o hegelianismo, e buscam constituir as suas filosofias como perspectivas, hu-manistas, que têm como referência a experiência humana, a existência e o existencial.
Kierkegaard postou-se, não obstante, numa perspectiva visceralmente religiosa, constituindo um existencialismo religioso. Podemos dizer que se ele rejeita e livra-se de Hegel, não livrar-se-á de Só-crates e de Platão. Alvos maiores, também, da crítica Nietzscheana. Junto com Hegel, e com o cristianis-mo. As três mortes do sentido do trágico, segundo ele.
De modo que, sem negar a importância e a contribuição da filosofia de Kierkegaard, parece in-teressante entender que ela é limitada em termos da constituição do sentido das psicologias e psicotera-pias fenomenológico existenciais. Histórica e filosoficamente elas devem, em essência, à filosofia de Nietzsche a inspiração de suas peculiaridades fundamentais. Em especial aos poderes de geração e regeneração da existência, de criação e libertação, de sua perspectiva radical de afirmação da vida. O sim dionisíaco.
Neste sentido, da inspiração da concepção e do logos metódico das PPFE, é interessante consta-tar a observação nietzscheana de que A existência não tem ‘dentro’. Todo padrão de interiorização é doença (o-riunda esta da repressão da potência, do possível, possibilidade ex-pressiva, intrínseca ao existencial).
A existência é (como devir) a partir de onde e quando ela assim é como tal. (Caminho por onde há espaço, meu tempo é quando... – Vinícius). Sua ventura (de vento) é a vivida ventura soprada perenemente pela potência do possível, dada no vivencial, no fe-nomenal.
De modo que existencialismo, assim entendi-do, é a afirmação desta ventura. Vida à ventura, aventura. Como ousadia, audácia, de afirmação da potência do possível, dado na vivencia eksistencial. É a vida da ousadia e da audácia da aventura. Da ex-perimentação, neste sentido, do estilo experimental de afirmação de uma vida que experimenta (Nietzsche).
As psicologia e psicoterapias fenomenológico existenciais partem de uma constatação e reconhe-cimento desta perspectiva existencial. E buscam compreender, definir e constituir, em suas concep-ções e metodologia, em seus estilos, condições para este modo de vivência, no contexto do trabalho psi-cológico e psicoterapêutico. Vivência aventuresca, audaciosa, do estilo experimental de uma vida que experimenta, e cria, e potencializa-se, na interpreta-ção de seus possíveis.
Ação, atualização, condições para a atualiza-ção de possibilidades inerentes à vivência. Seja atualização ao nível meramente compreensivo da vi-vência do cliente, seja ao nível compreensivo-objetivativo de sua experiência, na dialógica inter-humana da relação com o terapeuta ou psicólogo, e na habitualidade de sua vida. O resgate da habitua-lidade de um estilo ousado e audacioso, aventuresco, com relação ao vivido, à vivência da potência do possível, e à atualização do possível no vivido existencial entranhado.

Fundamental observar que, não raro, este possível é sofrimento, é finitude. Não há compro-misso entre o possível e o agradável, entre o vivido e o sucesso. No meio da noite, Nietzsche, em seu amor fati, é o farol: Eu abençôo todo sofrimento... Nada do que é necessário me ofende... O que não mata, fortale-ce...”“.
O que Nietzsche indica é que a afirmação in-tegral da vida -- mesmo a afirmação do mais negro sofrimento -- se não abole a possibilidade do sofri-mento, e da finitude – afinal, eles são intrínseco à existência, podemos sofrer de uma super abundância de forças de vida, ou de uma falta de forças de vida... – se a afirmação integral da vida não abole o sofrimento e a finitude, potencializa o retorno das forças da vida, como uma super abundância de forças de vida, co-mo criatividade, e alegria.



e. Concepção da abordagem

Em linhas gerais, a concepção e o método das psicologias e psicoterapias fenomenológico existen-ciais assumem uma perspectiva existencialista, tal como estamos descrevendo. Em particular, elas se esmeram em criar condições para a oportunidade (kairós) de uma vivência existencial, no âmbito da sessão e do processo dito psicoterapêutico, do traba-lho psicológico ou da vivência grupal.
Estas condições envolvem a situação do tera-peuta, do psicólogo, numa mesma postura fenomenológico existencial experimental proposta para o cliente.
Trata-se de condições para que o cliente pos-sa se entregar dialogicamente, e inter humanamente compartilhar, a sua entrega à concrescência de sua atualidade e atualização existenciais. De modo que ele possa vivenciar, na sua intensidade própria, os limites, as aporias, desta atualidade. O que envolve a vivência dos sofrimentos e finitudes dela decorren-tes, mais ou menos agudos, mais ou menos cronificados, mais ou menos intensos. De modo a que possa secretar vivencialmente, fenomenológico existencialmente, os possíveis inerentes à potência da existência, e à superação, na atualização destes possíveis.
Fenomenológico existencial inter humano, no sentido dialógico que Buber descreve, o desempe-nho do terapeuta esmera-se, e apura-se, em abrir-se para o encontro, e para o desdobramento do encon-tro dialógico, com o cliente. Como co-laborativo, na laboração da vivência e das superações deste. Para isso, o terapeuta busca garantir certas condições de possibilidade deste encontro, e de sua performance fenomenológico existencial dialógica.


f. Metodologia

Rogers foi um dos principais propositores de uma metodologia para o provimento do estilo de uma vivência experimental para o cliente no proces-so da terapia.
Desde o ataque guerrilheiro na desconstrução do moralismo em psicologia e psicoterapia, com a sua noção, e a valorização da noção, de não diretivi-dade; passando pelas condições de criação de um clima terapêutico para o cliente: a consideração positi-va incondicional, a compreensão empática, e a genuinidade do terapeuta. Até o estilo fenomenológico existencial empírico e experimental de facilitação de grupos. Neste ínterim a proposição de uma pedago-gia fenomenológico existencial empírica e experimental.
Perls, fortemente bafejado pelo Expressio-nismo -- em especial pela experimentação teatral expressionista do audacioso e ousado teatro expres-sionista de Max Reinhardt --, desenvolveu o forte sentido de uma dramática expressionista, experi-mental e inter humanamente dialógica, como metodologia na relação com o cliente. Co-laboração experimental, no processo da laboração existencial experimental da vivência do cliente de sua atuali-dade e atualização existenciais. Dos limites, das aporias, e dos possíveis vivenciados nesta atualidade e atualização. Co-laboração no processo da labora-ção do cliente na atualização destes possíveis, na superação de seus limites, dos limites de suas fini-tudes, de seus sofrimentos. Na potencialização de seu processo ativo, de sua criatividade fenomenoló-gico existencial.

A experimentação, num sentido fenomenológi-co existencial (v.), é uma condição hermenêutica fundamental da metodologia das PPFE.
A concepção de experimentação, num sentido fenomenológico existencial, constitui-se na filosofia de F. Nietzsche, em particular no sentido de sua ga-ya scienza.
Enraíza-se consistentemente em toda a pers-pectiva nietzscheana da realidade e da verdade, como eminentemente perspectivas. A necessidade das perspectivas, da sua vivência, e da sua limitação por outras perspectivas.
Brentano, em sua linguagem, fala do caráter especulativo do ser. Que ele aborda através de seu empirismo aporético.
Poria origina-se de poro (grego), que significa passagem. A-poria significa limite, falta de passagem. Tanto para Nietzsche como para Brentano a existên-cia se caracteriza por aporias. A evolução até o limite, a falta de passagem. Ambos entendem que, no limite da aporia está a possibilidade, e a possibilidade da poiese. Ambos assumem uma ética deliciosamente apor-ética. São aporiófilos; aporiófilos é o que são.
A ética é um modo de proceder.
E a apor-ética deles define-se por privilegiar o fenomenal, o vivido, a perspectiva. Afirmá-los, em suas características, intensidades e intensificações próprias; até o seu limite, a sua aporia.
Este é o ponto próprio onde se detona o pos-sível, como poiese (atualização de possíveis). Onde se detonam novas perspectivas, em suas intensidades próprias. Novas perspectivas que limitam as prece-dentes.
O gozo da intensidade e do fluxo da perspec-tiva, o gozo do limite de sua aporia, e o gozo da superação, na potência ativa de novas perspectivas. Este o sentido da experimentação existencial.
Sem dúvida que a experimentação é sinôni-mo de tentativa, de risco. O risco de tentar o possível, sempre latente. A experimentação, não obstante, não é facultativa, é intrínseca à condição existencial humana. Ao gozo e à resolução existen-cial.
Nietzsche observaria:
Porque o medo é a vossa excepção. Mas a coragem e a aventura e o gosto do que é in-certo, do que ainda não foi tentado... a coragem parece-me ser toda a história primi-tiva do homem.
Invejou e roubou todas as suas virtudes aos animais mais corajosos e mais selvagens: foi só assim que ele se tornou... homem.

Pessoa colocaria a experimentação fenomeno-lógico existencial, aporética, diríamos, de forma que só Pessoa:
Tudo o que me acontece
O que se passa
Ou finda
É como um terraço
Sobre outra coisa ainda
Esta coisa é que é linda.

Pois bem, os psicólogos e psicoterapeutas são eminentemente aporéticos, aporiófilos. Perspectivativos, e aporéticos, aporiófilos. Assumem a radicalidade da afirmação do vivido, da afirmação da perspectiva vivida. E estão sempre interessados no limite, na aporia. Empiristas, assumem a vivência do curso, das intensidades e fluxos vividos da perspectiva; as-sumem e propõem a vivência da aporia, e a sua superação em novas possibilidades.
Como ponto de partida, é como se estivessem sempre perguntando ao cliente, onde é que está o limi-te? como é que está o limite? como é que está o sofrimento da finitude vivida? ou não vivida? ou por viver? E, como Nietzsche, implicitamente dirão sempre: ... Pois mui-to bem! Vamos lá, experimenta-te. Mas não quero voltar a ouvir falar de nenhuma questão que não autorize a ex-periência. Tais são os limites da minha ‘veracidade.

As raízes das concepções e metodologias das PPFE vão encontrar uma fonte fecunda, e das mais fundamentais, na filosofia do diálogo e do dialógico, de Martin Buber.
Buber contribui, em particular, pela compre-ensão do caráter ontológico do vivido fenomenológico existencial experimental, como re-lação, eu-tu, tal como ele designou.
Para Buber a vivência eu-tu resgata-nos da coisidade e da coisificação do modo eu-isso de ser-mos da cotidianidade. Existencial, o dialógico feno-menológico, eu-tu, demanda a entrega à concretude da atualidade existencial, em seus limites, finitudes, aporias, potências e sofrimentos. A partir daí pode determinar-se opção e superação. Que nos resgatam do decurso ilimitado do mundo e da vida coisifica-dos.
Estes esclarecimentos de Buber foram fun-damentais para a constituição progressiva do estado da arte das concepções e do logos metódico das PPFE. Em particular, no sentido do primado da en-trega radical à concreude da existência, como abertura para o modo dialógico, eu-tu, de sermos e como estratégia de potencialização e de superação.
Mas, mais que isto, as considerações de Buber sobre o dialógico, o eu-tu, entre as pessoas, o inter humano, e os elementos do inter humano , definem a análise de um conjunto de fatores que impedem o desenvolvimento da dialógica do inter humano; ao mesmo tempo em que permitem compreender e de-finir os elementos que o propiciam. Assim, propiciam o inter humano:
O privilegiamento do ser, ao invés do mera-mente parecer.
O privilegiamento do inter humano, que não é inerente ao meramente social.
O privilégio da conversação genuína. Ao invés do império do blá, blá, blá.
A presentificação do outro.
O privilégio da pedagógica abertura. Ao invés da imposição propagandística.
Todas estas, condições de possibilidade da dialógica do inter humano . Estas indicações de Buber serviram de preciosos guias para a definição do logos metódico do psicólogo e do psicoterapeuta fenomenológico existencial na sua relação com o cli-ente.

O empirismo fenomenológico existencial das PPFE é uma de suas características mais fundamen-tais. Devemo-lo originalmente a Aristóteles, tal como resgatado por Brentano.
Estas abordagens, como já observamos, privi-legiam a imediaticidade vivida do desdobramento da dialógica pré-teórica, pré-reflexiva, pré-conceitual, fenomeno-lógica e existencial. Seja do encontro entre o terapeuta e o cliente, seja a dialógi-ca da vivência, no encontro, de cada um “consigo mesmo”. Toda esta dialógica é, eminentemente, em-pírica; fenomenológico existencial empírica.
Podemos, assim, entender o primado de um caráter de vivência eminentemente empirista, como logos metódico das psicologias e psicoterapias fe-nomenológico existenciais. Como primado de filosofia de vida, como primado de vivência para o cliente no âmbito do processo do trabalho psicológi-co e psicoterapêutico, como primado de vivência metodológica, no desempenho do psicólogo e do psicoterapeuta, ao longo do processo de seu traba-lho.
Um caráter empirista, no sentido especifica-mente fenomenológico existencial, assim, como caráter metodológico fundamental.
O empirismo em si é uma abordagem da reali-dade na própria vivência da realidade, sem a mediação do conceitual, do teórico .
Aristóteles em seu tratado De Anima oferece uma alternativa fundamental, quando propõe -- ao largo do uso de seu método empírico nas ciências naturais -- que a consciência, igualmente, deve ser metodologicamente abordada empiricamente. Ou se-ja, a consciência deve ser metodologicamente abordada empiricamente, na própria vivência de consciência. E não a partir de princípios e pressu-postos teóricos.
Ele define, assim, a perspectiva do método de um empirismo da consciência.
Brentano segue a indicação de Aristóteles, e passa a esposar uma metodologia empírica de con-cepção e abordagem da consciência. Ou seja, uma abordagem da consciência na própria vivência da consciência, sem a mediação do teórico, e do concei-tual.
A concepção e o método da Psicologia, assim como o método da Filosofia, passam a ser entendi-dos, a partir de Brentano, e em sua tradição fenomenológica, como o mesmo método empirista das ciências naturais.

Uma particularidade definidora é a de que Brentano compreende a intencionalidade da consciên-cia: a consciência constitui-se como um campo em que a correlação sujeito e objeto já pré-existe de um modo indissociável, modo este anterior a qualquer possibilidade de separação, sujeito e objeto são coo-riginais em sua intrínseca correlação.
De modo que o empirismo fenomenativo da consciência em Brentano só poderia ser um empiris-mo do campo da consciência intencional – que se situa, assim, fora da dicotomização sujeito-objeto. E não, evidentemente, um empirismo objetivista, característi-co do empirismo da tradição anglo saxã. Empirismo objetivista este que fundamenta, inclusive, o empi-rismo do seu Pragmatismo.
Empirismo objetivista (não fenomenológico), assim -- e Pragmatismo, nele fundamentado --, que, fora de uma perspectiva da consciência como campo intencional, situa-se na perspectiva da dicotomização sujeito-objeto. E, não só: situa-se, enfaticamente, no privilegiamento do objeto no âmbito desta dicoto-mização.
Questão fundamental esta, uma vez que a Fenomenologia e o seu empirismo apontam para um modo de ser ontologicamente fundamental. Modo de ser este que não se dá no âmbito do que podemos entender como a dicotomização sujeito-objeto.
Silvia Pimenta , comentando a perspectiva e o perspectivismo da filosofia de Nietzsche, observa:
Não se trata portanto da impossibilidade de atingir uma realidade exterior aos nossos afe-tos, mas da impossibilidade de distinguir duas ordens de realidade: subjetiva e ob-jetiva, ideal e material, numênica e fenomênica. Trata-se da impossibilidade de transcendência: o que quer que seja “o mundo”, o homem é parte integrante dele, e não pode reivindicar a exterioridade que seria necessária para instituir a si mesmo como sujeito e ao mundo como objeto. O percurso que conduz do homem ao mundo não é uma relação entre sujeito e obje-to: sendo o homem uma parte do mundo e não uma instância a ele transcendente, a vontade de potência no homem constitui apenas um caso particular da vontade de potência em ge-ral. Curiosamente, a filosofia de Nietzsche se aproxima aqui da concepção parmenidiana da identidade entre ser e pensar: entre o mundo e o ato de interpretar não há afinidade ou ade-quação, mas identidade. (Velloso Rocha, 2003. p.65.).
De modo que, especificamente, o empirismo fenomenológico não é um empirismo do objeto. Mas um empirismo da vivência de consciência.
Da mesma forma, não permite uma intersubje-tividade. Na medida em que se dá fora da dimensão da dicotomia sujeito-objeto, não dispondo, em seu momento, do sujeito, da mesma forma em que não dispõe de objeto.

Ainda que não se dê no âmbito da dimensão própria à relação sujeito-objeto. A vivência fenome-nológica empírica é sempre vivência de relação, e tensão de diferença, de alteridade. A dualidade de relação da vivência fenomenológico existencial em-pírica se dá como a dualização da relação eu-tu.
Quando ocorre a diferenciação sujeito e obje-to já não se está mais no modo de ser dialógico da vivência.
Assim, o empirismo da consciência fenomenal da fenomenologia da tradição de Brentano é um empi-rismo fenomenológico da vivência de consciência intencional, um empirismo ativo, cujo solo e natureza é radicalmente diferente dos do empirismo objeti-vista.

Carl Rogers, F. Perls, F. Brentano, F. Nietzs-che, Paulo Freire (vale dizer) eram, assim, empiristas. Mas empiristas neste sentido fenomeno-lógico existencial dialógico. E, jamais, empiristas no sentido objetivista do termo.

Caracteristicamente, a crítica teórica encontra algo de vazio e inconsistente na obra desses empiris-tas. Isto se dá, exatamente, porque eles não são teoréticos. Eles são empiristas poiéticos. Que se defi-nem pelo privilégio da vivência de consciência, e da vivência do ato, da ação: da atualização do possível, que só no âmbito do seu pathos (empathia) pode evi-denciar-se, efetivar-se.

Isto não quer dizer que suas concepções não gerem uma teoria, não sustentem, e não se susten-tem, em uma teoria. Ou que da vivência de seu método não se possa derivar uma teoria. Muito pelo contrário, a definição de seu método cristaliza-se te-oricamente. E teorização pode emergir da vivência de seu método. A característica, não obstante, é a de que a vivência de seu método é a vivência momen-tânea de um modo não teórico, fenomenal, de sermos. Um modo no qual vivenciamos o possível, e a sua atualização. Ou seja, um modo de sermos no qual o possível é possível, e se desdobra.
Nada contra a teorização anteriormente aos momentos especificamente empíricos, e não teóricos. Ou posteriormente.

Carl Rogers, por exemplo, era, definitivamen-te, um empirista. Um empirista radical. Um empirista da vivência dialógica do inter humano.
Isto é preciso que se entenda, e se explicite.
Mas é necessário que, igualmente, se entenda, e se explicite, que, radicalmente empirista, Carl Ro-gers nada tinha do empirismo objetivista, do empirismo pragmatista, do empirismo positivista. Por mais que isto não tivesse ficado conceitualmente claro, muitas vezes. E por mais que o confundissem, explicitamente, ou não, muitos de seus seguidores.
Uma coisa é a “empatia” objetivista, com toda uma série de adornos da moda e peduricalhos pos-síveis. Outra coisa é a empatia na dialogicidade do inter humano, fenomenológico existencial dialógica, e empírica.
Carl Rogers prigilegiava radicalmente a vi-vência dialógica empírica, e empática – patética, peripatética --, do encontro com a pessoa, do encontro com o grupo. Nada de conceitos a intermediar este encontro. Nada de técnicas ou de outros recursos comportamentais. Nada de moralismo ou de pre-tensões científica, ou cientificistas. Nada de teoria, de teorização, de teorética. O que interessava fun-damentalmente a Rogers era a empiria dos momentos dialógicos de vivência do encontro; o que quer dizer, a empiria da vivência da poiética da dia-lógica do encontro. Da vivência empáthica da dialógica do possível, e de sua interpretação (des-dobramento), atualização, inerentes à empiria da vivência de consciência fenomenal.

As abordagens fenomenológico existenciais de psicologia e de psicoterapia primam assim pelo privilegiamento do âmbito vivencial fenômeno-lógico existencial, pelo âmbito da compreensão, e do desdobramento do possível que lhe é inerente.
Em essência, a explicação, que se diferencia fundamentalmente da compreensão (em particular porque não há explicação que possa levar à compreensão – Takuan Soho), a explicação, é absolutamente se-cundária para as psicologias e psicoterapias fenomenológico existenciais.
Se Freud explica, primordialmente as aborda-gens fenomenológicas não estão interessadas na explicação.
Os psicólogos, os terapeutas fenomenológico existenciais, em essência, não explicam. Eles impli-cam.
No sentido de que eles não são exteriores e alheios à dialógica alteritativa do encontro inter humano com o cliente. É a esta dialógica que eles querem privilegiar, e a ela pertencer implicativa-mente, compreensivamente.
A arte que eles buscam cultivar é da perfor-mação como partícipes no próprio âmbito desta dialógica. Como forma de potencializar a situação do cliente no âmbito de sua própria vivência dialó-gica, na dialógica da vivência de sua relação com o terapeuta/psicólogo, na dialógica da relação em seu ser-no-mundo.
De modo que ele possa vivenciar compreen-sivamente, e no desdobramento de sua compreensão, vivência, a sua atualidade e atualiza-ção fenomenológico existenciais; suas perspectivas, limites, aporias, e superações.

Compreensão e desdobramento de compre-ensão; vivência e desdobramento de vivência, como atualização de possibilidades, que em hermenêutica fenomenológico existencial entende-se como inter-pretação fenomenológico existencial.

Classicamente, a Hermenêutica é entendida como a arte da interpretação. De modo que as psicolo-gias e psicoterapias fenomenológico existenciais são, em essência, e propriamente, hermenêuticas feno-menológico existenciais.

Aparentadas da arte, porque a arte é irmã gêmea da existência... A arte é uma ética, est-ética, de afirmação estésica da existência. Estética de afir-mação vivida da vivida afirmação que é já a potência da existência e da existenciação, em suas perspectivas espontâneas e gratuitas, em seus limi-tes, sofrimentos, superações, alegrias...
Nem teorética, nem prática... poiética. Patéti-ca.